Quatro semanas se passaram.
Laura finalmente tinha toda a grana de
que precisava. Ligou para Cecília.
L – Vem pra cá. Hoje vamos fazer nossa
inscrição na faculdade.
C – Laura, LAURA, calma, respiiiiiira!
Preciso ver se minhas economias dão pra isso!
L – Cecília, me poupe, vai. Você vem
salvando grana desde que tinha DOZE anos de idade!
C – Okay, verdade. Mas já usei um pouco.
Meus livros da faculdade não eram NADA baratos.
L – Ainda assim, Cecy, você deve ter mais
dinheiro do que eu, te garanto!
C – Falando nisso, Laura, quais são seus
planos? Como vamos nos manter em Seattle por 6 meses? Quer dizer, vamos
precisar de um emprego, eu acho.
L – Okay, quando a gente chegar lá,
resolvemos isso. A única coisa que a gente precisa, e AGORA, é fazer a
inscrição. Ainda temos que ser admitidas. Não esqueça de trazer seu TOEFL
score! Você vai precisar dele. Já ta vindo?
C – AAAAAI LAURA! Quando você enfia
alguma coisa na cabeça, agüenta você, né? Já tou indo, dá 15 minutos que já
chego aí.
Cecília foi até sua gaveta, separou
alguns documentos dos quais precisava (incluindo o TOEFL score), colocou tudo
na bolsa, pegou a chave do carro e desceu as escadas. Encontrou sua mãe na
sala, recém-chegada do trabalho.
C – Oi mãe, já chegou?
A – Saí mais cedo hoje... então, onde
você tava indo?
C – Vou na Laura. Parece que ela precisa
de ajuda com... – Cecília escolheu bem as palavras. Sua mãe não precisava saber
que ela ia estudar em Seattle, junto com Laura, ainda mais fazendo dança. Ainda
não era hora de ela saber. – umas coisas
que ela trouxe do banco. Ela precisa dar baixa em um monte de títulos de
protesto para amanhã.
A – E é permitido isso? Trazer coisas do
banco pra casa?
C – Não é, né mãe, maaas enfim, o que ela
ia fazer? Ela não pode ficar além de seu horário, então a solução foi trazer o
serviço pra casa... – Cecília estava nervosa. Odiava mentir para sua mãe. –
Bom, tô indo que ela ta me esperando... eu provavelmente demore lá, então nem
precisa me esperar pra jantar. Já está tudo pronto na geladeira, é só
esquentar!
A – Obrigada, filha.
C – Tchau mãe, até mais tarde.
Cecília entrou no carro, ainda tremendo
um pouco. Ela ainda precisava achar uma boa desculpa pra dar à mãe. Ela não
podia simplesmente chegar de uma hora pra outra e dizer : oi mãe, tou indo
estudar dança em Seattle, beijo tchau! Ela sabia que o sonho da mãe era vê-la e
seu próprio restaurante, e toooodo aquele bla bla bla que ela já conhecia de
cor e salteado, desde os seus 15 anos. Cecília e Laura tinham acabado de se
formar. Nem tinham um emprego decente ainda. Laura trabalhava no banco, como
funcionária temporária, até que ganhava um salário bom pra primeiro emprego, e
Cecília trabalhava como recepcionista bilíngue numa empresa de logística. O que
já estava a deixando meio de saco cheio. Aquilo não era pra ela. Ficar o dia
inteiro sentada atendendo telefone, mandando e-mails, recebendo pessoas,
preparando reuniões, comprando passagens aéreas pros diretores... ela é quem
queria estar viajando! Mas pera... não era exatamente isso que elas iam fazer?
Foi o que ela pensou, enquanto dirigia para a casa de Laura.
Estacionou o carro, e tocou a campainha.
H – Oi Cecy! Tudo bem? Veio ver a Laura?
C – Oi dona Helena! Vim sim, onde ela ta?
H – No quarto, ela ta cercada de coisas
do banco... uns papéis de títulos de alguma coisa, num entendi direito o que
ela me falou.
C – AHAHAHA, sim, claro, foi por isso que
ela me ligou, pra eu ajuda-la. Ela sabe que eu digito super rápido, aí fica
abusando das minhas mãos, porque ela não pode ter tendinite, mas eu sim, né!
Certinha ela! (Cecília ria. Até as mentiras que as duas contavam eram iguais,
Deus, elas tavam perdidas na vida mesmo.)
H – Ai, vocês duas... posso jurar que
vocês devem ter sido irmãs em uma outra vida!
C – Talvez... – Cecília não acreditava
nessa coisa de “outra vida”. Vida era uma só, era essa, era agora. Se existisse
mesmo essa parada aí, porquê deixar a outra vida, que deveria ser melhor do que
essa, pra vir pra esse mundo sofrido, onde filhas “exemplares” tinham que
mentir pra mãe, só pra não desaponta-las? É, Cecília ainda estava meio tensa
com toda essa história de viagem... puta merda, a Laura só a metia em roubada!
H – Bom, parada aí na porta é que você
não pode ficar, né? Sobe lá no quarto da Laura, quando o jantar estiver pronto,
eu chamo vocês... você fica pra jantar conosco, né?
C – Provavelmente sim, dona Helena!
Cecília subiu. Entrou no quarto de Laura
(ela nem batia na porta, não precisava disso. Cecília já era da casa) e a
encontrou na frente do computador, com a cara mais perdida do mundo. A mesma
cara que ela estava no dia em que se conheceram...
“Caramba!
Quem é essa? E que cara de medo é essa? Será que ela é aluna nova? Coitada, ela
vai ter a maior dificuldade do mundo pra fazer amigos. Vou desejar boa sorte,
ela vai precisar.” – Cecília tinha acabado de chegar na sala de aula, estava
super empolgada pelo primeiro dia na escola, reveria todos os seus amigos, e
aquele era um ano especial, era o último ano da turma no chamado “primário”. A
partir do ano que vem, eles estariam na 5ª série, e seriam “ginasiais”. Não via
a hora de rever as amigas. Dois meses
longe da turma tinha sido bastante tempo. Ela tinha se divertido tanto nas
férias! Não via a hora de contar para as amigas como tinham sido as férias na
Europa.
Sentou-se
em sua cadeira cativa (desde a primeira série, a disposição das carteiras era a
mesma) e ali ficou, esperando as amigas. Elas foram chegando, uma a uma. Cada
abraço, cada gritinho empolgado, já era
esperado. E a menina nova continuava ali, parada, com o olhar perdido e a
expressão de quem estava com muito medo do que viria a seguir.
Cecília
estava incomodada. Será que ela não iria sentar? Virou-se para as amigas e
perguntou se podia chamar a menina nova para se sentar junto com elas. Algumas
disseram TANTO FAZ, outras não gostaram muito da idéia, mas quem não gostou
mesmo foi Beatriz, a “líder” da turma. Bom, Cecília e ela já não estavam se
dando muito bem mesmo, ultimamente Beatriz andava por aí como se tivesse o rei
na barriga... ela foi até a menina, e passou a mão na frente do seu rosto, pra
se certificar de que ela estava realmente ali e que não iria falar sozinha,
como se estivesse falando com uma parede.
C
– Olá-ááá... tem alguém aí?
Laura
se assustou. De verdade.
L
– Puxa! Desculpe, me assustei.
C
– Nossa, eu sei que não sou lá essas coisas de bonita, mas as pessoas por aqui
geralmente disfarçam, sabia?
L
– Não, não é isso! É só que... eu... to meio perdida. Num sei direito o que
fazer.
C
– Bom, acho que você poderia escolher uma cadeira e se sentar. Aproveita que a
sala ainda não lotou, e tem um monte de carteiras disponíveis.
L
– E-Eu... eu posso me sentar naquela ali? – apontou para uma carteira ao lado
da de Cecília.
“Ai
caramba, justo naquela... a Beatriz vai ficar uma fera... bom, e daí também, né, não tenho nada a ver
com os chiliques da Beatriz.”
C
– Pode. Vamo lá.
Laura
se sentou ao lado de Cecília. Não demorou muito, e a maior parte da turminha de
Cecília já estava a excluindo dos papos.
Dias
se passaram. Cecília passava os intervalos tentando inserir Laura na turma. As
meninas reclamavam, falavam que Laura não tinha nada a ver com elas. “Aqueles
óculos enormes são muito bregas!”, elas diziam. Cecília, sem saber direito o
porquê, se sentia bem com Laura.
Até
o dia em que chegou a Beatriz, com todo seu nariz empinado e sua pompa de
princesa, e disse a Cecília que ela teria de escolher entre a turma e a Laura.
E ela, com o maior orgulho do universo, encheu a boca e disse : Eu escolho a
Laura!
Laura
não podia negar que estava muito feliz, Cecília tinha sido gentil com ela desde
o começo. Mas, por trás dos óculos enormes de aro grosso, os olhinhos dela
continuavam amedrontados...”
E foi olhando pros olhos de Laura que
Cecília lembrou-se de voltar para a realidade.
C – Laura... você tá com a mesma cara de quando eu te conheci... o que
foi agora? Num vejo uma sala de aula cheia de idiotas na nossa frente!
L – Ainda não... mas terá. Logo menos.
C – Quer desistir? Ainda dá tempo!
L – Mané desistir! Você sabe que eu não
sou de desistir do que eu quero! Nós vamos, e pronto.
C – Sabe, Laura, tem horas que eu me
arrependo de ter ido te chamar pra sentar do meu lado, lá na quarta série. Você
só me mete em encrenca.
L – Mas fala que você adora se meter em
encrenca comigo... não adora?
C – Éééééé... NÃO!
L – Okay, Cecy... se você não quiser
fazer isso desta vez, sem grilos... vou sozinha... –e Laura virou-se para a
tela do computador outra vez.
Cecília se aproximou dela, a abraçando.
C – E quando foi que eu deixei você se
meter em furada sozinha? Nós temos um trato, não temos? TAMO JUNTA, parceira!
Laura gargalhou tão alto que a mãe gritou
lá de baixo o que é que estava acontecendo.
L – Nada, mãe! Você sabe como a Cecy é
palhaça!
C – E ainda saio de idiota na história...
ai ai... bora dona Laura Azevedo, faz logo essa inscrição aí, antes que eu me
arrependa.
Cecília e Laura sentaram-se uma do lado
da outra. Começaram pela inscrição de Cecília, no curso de dança.
Logo após, Laura fez a dela, no curso de
fotografia.
L – Pronto!
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Zac fechou o notebook.
Z – Feito. Daqui um mês, começam minhas
aulas. Já podemos começar a procurar algo em Seattle?
T – Zac, eu preciso conversar com a
Rachel. Ela não pode sair daqui agora, ela tá no meio da faculdade dela... e eu
vou ter que ir com você, não tem jeito. Não sei como ela vai reagir à isso.
I – Taylor, também num precisa de tanto
drama. Daqui a 6 meses, estaremos de volta. Aliás, vai ser bem bom vocês se
afastarem um pouco, porque o que vocês têm brigado ultimamente, olha, num tá
fácil aguentar vocês não!
T – Como assim, Isaac? Quando foi que eu
briguei com a Rach na frente de vocês?
I – Você não briga com ela na nossa
frente, mas depois temos que aguentar o seu mal humor.
Z – É verdade, Taylor. E Isaac, o que
você vai fazer com a Ashley?
I – Vou fazer o quê? NADA, oras, não tem
o que se fazer. Eu e ela ficamos umas 4 vezes, nada mais. Não quero ter
compromisso com ninguém nessa altura do campeonato. Temos que focar na NOSSA
gravadora, no NOSSO CD... isso é que é o importante agora. E, claro, o curso de
fotografia do Zac.
Z – Okay, olhem só, achei este pra gente
locar... o que acham? – Zac virou o notebook para os irmãos. Era uma bela casa
em Capitol Hill.
I – Três quartos... é tá bom, gostei.
Z
-Beleza! Já vou entrar em contato com a mulher, podemos ir pra lá semana
que vem e ajeitar as coisas, o que vocês acham?
T – Espera eu conversar com a Rachel
primeiro, Zac?
Z – Tudo bem, Taylor. Você tem até amanhã
pra falar com ela.
Taylor não precisaria de todo este tempo.
No mesmo instante, pegou as chaves, e saiu.
A conversa com a Rachel não seria
fácil... a relação dos dois já andava meio estremecida. Agora então, com ele
indo pra Seattle... ele tava apostando que ela não ia curtir nada essa
história.
E foi mesmo. Ela não curtiu. E Taylor
voltou pra casa mais triste, mas também mais leve.
I
-E aí, Taylor, como foi com a Rachel?
T – Bom, foi basicamente isso : eu falei
que ia pra Seattle, ela perguntou o porquê, disse que o Zac iria fazer um
curso, e que nós 3 não poderíamos ficar separados agora, ela disse que não
havia necessidade nenhuma de eu ir, que o Zac é grandinho e sabe se virar
sozinho, e aí eu expliquei que ele REALMENTE não pode ir sozinho, ela ficou
brava, e aí eu disse que era melhor a gente dar um tempo. Nem preciso dizer que
ela ficou FULA da vida, né... enfim, tou tranquilo agora. Acho que já brigamos
tudo que tínhamos pra brigar, e vamos ter 6 meses de paz...
Z – Ou não, né? Vai saber...
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